Um passeio de 30 léguas - parte 4
- Flauber Barros Leira
- 15 de mai. de 2019
- 3 min de leitura
A fazenda Pendência esta situada em uma pequena eminencia, donde se goza de vista aprazível. O seu nome, segundo me informaram, e uma abreviação da palavra – Independência, dada a sesmaria de três léguas de terras, onde se acha essa e outra fazendas.
O capitão Claudino da Costa Ramos, seu proprietário, e um dos fazendeiros mais abastados da comarca de S. João do Cariry.
Conversando largamente com ele a respeito do método rudimentar da criação nesta província e suas vizinhas, não sei se o convenci da absoluta necessidade de empregar-se método mais adiantado, melhorando-se ao mesmo tempo a raça do nosso gado, que se acha tão degenerada.
Tendo declarado que na seca do corrente ano havia perdido mais de trezentas rezes, disse-lhe:
Pois bem! Reduza todas as vacas que possui a um terço ou menos, contanto que sejam escolhidas, e há de lucrar muito mais, uma vez que, tendo cômodos suficientes para trata-las em qualquer seca, ficara isento de tão grandes e frequentes prejuízos.
Aceitaria o meu conselho? Tenho dúvida, porque a rotina ainda tem muito poder entre nós.
Restauradas as forcas nesse confortável descanso, as quatro e meia horas da tarde seguimos viagem, tendo mais um companheiro, o infatigável Dr. Chateaubriand.
O caminho durante duas léguas corre paralelo a serra do Borges, ramificação da cordilheira, que, com o nome de Carneira e outros, forma a orla da Borborema na sua vertente ocidental. A serra do Borges e baixa, não contem nada de notável; apenas algumas furnas, refúgio das suçuaranas que infestam os campos das fazendas vizinhas, e a – pedra bonita, enorme rochedo de forma arredondada, que somente em pequena base de poucos palmos quadrados equilibra-se sobre outro no seu ponto mais elevado.
Depois da fazenda Borges, que dá nome a referida serra, com mais duas léguas, chegamos as 8 horas da noite a de Poço dos Cavalos, pertencente a opulenta família Carcará, da província do Ceará.
Francisco Fernandes Vieira, Visconde do Icó, foi, de princípios deste século ate o meado, o fazendeiro mais rico da vizinha província do Ceará; e como naquele tempo todo gado de sua província era consumido no grande mercado do Recife, como ainda e hoje em grande parte, parece que, situando diversas fazendas nesta província, teve por fim estabelecer escalas ou depósitos para refazer suas boiadas, que todos os anos transitavam para Pernambuco.
As fazendas que fundou nesta província estão no vasto platô da Borborema, tais são: Batalha, Viração, Seridosinho, Barra, Mucuitú e outras ate Campo do Boi, próximo a cidade de Campina. Todas elas se acham hoje partilhadas por filhos e netos, herdeiros do seu fundador; e nenhuma ainda foi alienada; sendo administradas por dois procuradores; os Srs. José Ferreira da Silva e Francisco Casulo.
O rio Mucuitú, que banha a fazenda Poço de Cavalos, onde pernoitamos, nasce nessa cordilheira, de que falamos, limite ocidental da Borborema, e traçando o seu curso de noroeste a sudeste, depois de passar pela afamada – Ponta do Poço, origem de tantas lendas populares, forma um dos principais afluentes do rio Taperoá, o mais poderoso braço do Paraíba.
O Sr. Francisco Gonçalves Lima, vaqueiro da fazenda, hospedou-nos com essa franqueza sertaneja conforme permitiam os seus poucos recursos, isto e, partilhou conosco a sua ceia de coalhada.

No dia seguinte (30) madrugamos para chegar cedo a villa do Batalhão, distante cinco léguas, ponto objetivo de nossa viagem.
Timbaubeira, Lagoa do Escuro, Lagoa do Meio e Quixaba, são os lugares intermédios por onde passamos; e em todos eles parecia que o povo conhecia o fim de nossa viagem.
-Sem duvida vão ao casamento do capitão? Perguntou o dono de uma casa, onde paramos para beber água.
-Qual capitão?
-Ora! Qual há de ser! O Capitão Sulpício.
-Não há duvida; vamos.
-Eu logo vi; concluiu o sertanejo.
Este pequeno dialogo e uma eloquente prova do grande prestigio, de que goza o nosso amigo capitão Sulpício Torres Villar, no município de sua residência. Muitos outros capitães existem la, mas quando o povo quer referir-se a um deles acrescenta sempre o seu nome, isto e, diz; -capitão Fulano-, capitão Sicrano. A palavra capitão simplesmente designa aquele nosso amigo, com toda a forca da expressão latina donde e derivada.
Estávamos ansiosos por chegar ao termo da viagem. Afinal o Dr. Chateaubriand, que conservava-se sempre na dianteira, do alto de uma eminencia, por onde atravessava a estrada, exclamou:
-Batalhão!
A casaria da vila, alvejando reluzente aos raios de um sol, a aquela hora já abrasador, esta a um quilometro de nos. Do meio dos tabuleiros pedregosos e de aspecto tristonho, onde rareiam as arvores, destacava-se uma imensa linha de verdura; era o rio, de leito estreito, mas ladeado de magnificas ilhas, cheias de milharais.
Pouco menos de nove horas era, quando chegamos.
(Continua)
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