Uma viagem de 30 léguas - Parte 5
- Flauber Barros Leira
- 20 de mai. de 2019
- 4 min de leitura
Batalhão* é a vila de fundação mais recente de toda a província. Até 1867 era um lugar inteiramente despovoado, havendo apenas algumas fazendas nas proximidades, ao longo da estrada e na direção da lagoa do Batalhão, que lhe deu o nome.
Um membro da família Farias, que por aí habitava, o Tenente Manoel de Farias, foi a primeira pessoa que construiu uma casa à margem da estrada, fundando um estabelecimento comercial. Promoveu em seguida a criação de uma feira, formando-se com rapidez a povoação, que é hoje a linda vila do Batalhão, contendo perto de 150 casas.
A grande estrada do alto sertão da província, denominada de Espinharas, passando pelo centro da vila; entretêm um ativo comercio de transito; o que junto a feira semanal de gêneros alimentícios e de todos os produtos do município, a melhor da extensão comarca de S. João, assegura-lhe um futuro prospero; tanto mais se for prolongada até lá a via férrea Conde D’Eu como urge o bem estar de todo o sertão da província.
A vila já possui bons estabelecimentos comerciais, sendo o principal o do capitão Laureano Bezerra de Albuquerque, abastado negociante o proprietário, que poderosamente tem concorrido para o aumento da localidade, construído diversas casas, entre as quais o excelente sobrado que lhe serve de confortável residência. Segue-se a loja de fazendas do Sr. Pedro de Farias e outros estabelecimentos comerciais, merecendo também menção especial o do Sr. André Porfírio Delgado, jovem de uma atividade e gênio comercial notável que estende as suas transações ate as vilas de Patos e Teixeira.

Para celebração do culto divino existem somente a capela do cemitério, situado em condições anti-higiênicas por estar ao Nascente e quase dentro da vila. Acha-se porém principiado um bonito templo graças à iniciativa e esforços do benemérito Pe. Manoel Ubaldo da Costa Ramos, que lá reside até princípios do corrente ano, quando foi nomeado vigário da freguesia de Alagoa do Monteiro.
O lugar escolhido para edificação não podia ser mais apropriado: é elevado, havendo espaço para uma grande praça na frente. Está a igreja colocada sobre uma pedreira de granito que para ser nivelada demandou penoso trabalho. A base do edifício é, portanto, a mais sólida possível; e suas paredes exteriores já se acham em altura de dois a três andaimes, achando-se na mesma altura as fortes colunas que dividem a nave dos corredores laterais.
A igreja tem cerca de 85 palmos de frente com 160 de fundo e ficará um majestoso templo, digno da próspera vila, é um titulo honroso da passagem do Rev. Vigário Costa Ramos por ela, onde é tão estimado.
O nome – Batalhão – aplicado a uma vila, parece não soar bem, pode-se dizer mesmo que é extravagante. E para desejar que ele seja trocado por outro mais eufônico.
A tradição histórica ou lenda deste nome, segundo me informaram, e a seguinte:
No principio do século passado nas entradas que fizeram dois capitães-mores para a conquista do sertão, sucedeu que os índios Cariris se reunissem, atacando um deles que se achava acampado com o seu batalhão nas proximidades de uma lagoa. Depois de três dias de cerco, em que sustentou continuados combates com centenários silvícolas, foi socorrido por seu colega, o capitão-mor, Teodósio de Oliveira Ledo, e unidos derrotaram os inimigos que fugiram para Piancó.
A lagoa recebeu por isso o nome de Batalhão, para indicar talvez o lugar onde houve uma grande batalha.
Nesse município e nos outros da extensa comarca de S. João, assim como na do Monteiro, foi grande a mortandade de gado, ocasionada pela seca do ano passado para este.
Tarde e com grandes trovoadas principiou a estação invernosa, sendo notável uma chuva de pedras acompanhada de vento fortíssimo, que motivou enorme cheia no rio, causando grande prejuízo na criação miúda.
A semelhante tempestade, que mais ou menos forte caiu sobre todo o Cariri, sucederam meses de um sol abrasador; de modo que as lavouras plantadas, nascendo com o maior vigor e do mesmo modo crescendo em quanto a terra conservou frescura, estavam definhadas.
Por vezes, tive ocasião de ver e experimentar os efeitos da seca que está devastando o sertão. Da Fazenda Pendência em diante das pastagens para os gados são menos abundantes, e as lavouras, ultimo recurso do pobre povo sertanejo, estavam a perder-se, se não chovesse logo.
Nessas criticas circunstâncias, o criador e o agricultor sertanejo todos os dias consultando o céu no ocaso do sol. Sovem uma nuvem carregada que ocupe o horizonte, a que chama – barra, fitam-na com o maior interesse; e daí nasce uma esperança, muitas vezes vã, se dela aparece o sulco de fogo de qualquer longínquo relâmpago.
Calculam com a maior exatidão, o lugar que se acha debaixo daquela nuvem; sondam todo firmamento; falam à respeito da posição do carreiro de S. Tiago**, examinam se está límpido ou carregado e concluem, uns alimentando as esperanças e outros desenganados de chuvas.
O meu distinto companheiro de viagem, o Dr. Rabelo, diante de tão triste espetáculo, vendo a miséria prestes a cair sobre aquela população, informado de que grupos de retirantes, famintos e andrajosos já partiam do alto sertão, procurando o litoral, não poderia ser indiferente e por vezes dizia:
- O sertanejo vive em constante luta com a natureza.
Nada mais exato. É nessa luta desigual que o governo devia intervir com o seu potente braço para sustentar o homem que a natureza inclemente procura esmagar.
Infelizmente assim não sucede.
(Continua)
*Batalhão e o antigo nome da cidade de Taperoá, Paraíba
** Uma Via Láctea, Via Látea, caminho de São Tiago, estrada de Santiago, estrada de São Tiago, carreira de São Tiago ou carreiro de São Tiago é uma nebulosa que forma longa mancha branca no escuro do céu.
Comentários